quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Cemitérios podem influenciar o meio ambiente e a saúde pública

por Virginia Delfino e Tomás Lombardi



“Todo cemitério é uma fonte potencial de poluição do subsolo”, diz o professor e geólogo Lezíro Marques Silva, ex-técnico da Cetesb (Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental) e um dos pioneiros a estudar – em âmbitos nacional e internacional - os impactos ambientais causados pela emanação de substâncias oriundas da decomposição do corpo humano.

Pesquisador do assunto há 38 anos, Lezíro e a equipe da qual faz parte, vêem se dedicando a entender os malefícios que os cemitérios construídos sem prévio estudo do solo podem causar ao meio ambiente. “Devemos ficar atentos para uma série de fatores para a construção de um cemitério: deve ser feito um estudo hidrogeoambiental da área em que ele será construído para verificar se o solo tem condição de decompor o cadáver, se há hipótese de poluição do lençol freático da região e ainda se não causará poluição aérea devido à emissão de gases”, alerta Silva.

A curiosidade sobre os processos que norteiam a decomposição de cadáveres e, em especial como este fato interage com o meio, foram seus pontos de partida. Dentre muitas indagações, o professor buscava entender se havia relação de contaminação do solo com as cargas tóxicas que os corpos em decomposição emitem e quais os riscos para a população – principalmente às comunidades que vivem próximas a cemitérios.

Ao estudar o passo a passo do processo de decomposição do corpo humano, o professor e sua equipe constataram que os cadáveres produzem gases mortuários e um líquido chamado necrochorume (neologismo criado para designar o líquido diluente cadavérico), que podem contaminar o meio ambiente se não forem tratados de maneira adequada. Além disso, devido às condições inadequadas do solo e do clima, podem ocorrer fenômenos de conservação e os cadáveres não de decompõe totalmente.

De acordo com o Código Sanitário do Estado de São Paulo as exumações devem ser feitas após três anos do sepultamento e caso a decomposição não esteja finalizada um novo sepultamento é efetuado por mais dois anos. Ao final de cinco anos não está previsto o que fazer após a segunda exumação, caso o cadáver permaneça preservado. Essa e outras normas que regulamentam a construção e operação de cemitérios não são suficientes para conter os poluentes.




A pesquisa - Um corpo humano de 70 kg, por exemplo, demora três anos e meio para se decompor. No primeiro mês de enterrado ele produz aproximadamente 24 litros de gases e nos próximos seis meses 30 litros de necrochorume, que é composto por 60% de água, 30% de sais minerais e 10% de substâncias orgânicas biodegradáveis, que carregam vírus e bactérias, dentre outros microorganismos. Nessa porcentagem de substâncias biodegradáveis existem duas que se destacam: a cadaverina e putrescina, que são extremamente solúveis em água, e se entram em contato com o lençol freático formam uma pluma de poluição e o contamina.

Além do processo natural de decomposição, existem também alguns fenômenos de conservação, por processos biológicos ou físico-químicos, que podem ocorrer nos corpos sepultados em solos arenosos, argilosos, úmidos e em clima extremamente quente. Nesses casos, os cadáveres permanecem preservados e podem causar conseqüências diretas e incisivas nos aspectos hidrogeológico, geoambientais e geossanitários, pois quando os corpos não sofrem a decomposição completa, os vírus e microorganismos infectantes permanecem ativos.


Condições adequadas de Sepultamento

Segundo o Prof. Lezíro, a cremação do corpo humano é a maneira mais eficaz para eliminar todas as substâncias que poderiam contaminar o meio ambiente. No entanto, quando ocorre o sepultamento, algumas medidas devem ser tomadas para que não haja riscos de contaminação.

O ideal é manter o necrochorume, substância que traz maior perigo para o meio ambiente, dentro dos túmulos para a secagem a fim de evitar a infiltração no solo e posteriormente no lençol freático. Isto é conseguido facilmente com a implantação de lajes no fundo das sepulturas para que haja a contenção do líquido. Nos casos em que as condições geoambientais e de clima não são adequadas para decompor o corpo humano, pode ser feita a utilização de substâncias que propiciem e acelerem o processo de decomposição dos cadáveres e que ainda neutralizem as substâncias emanadas por eles.

Os cemitérios são, potencialmente, empreendimentos de risco ambiental, porém, não são todos vilões do meio ambiente. No caso dos cemitérios públicos da cidade de São Paulo aproximadamente 75% se encontram com problemas, devido a condições inadequadas de sepultamento. Já os cemitérios particulares se preocupam em atender as condições adequadas, como a seleção do local e a implementação de técnicas operacionais que garantam a não contaminação do meio ambiente.